Leo Kret do Brasil: travesti e dançarino é um dos vereadores mais votados de Salvador.

Inovação na política baiana


“Em meu rosto maquiagem. No meu corpo purpurina. Meu pai me chama de moleque. Mas eu sou uma menina”. O autor dos versos não poderia ser outra pessoa: Leo Kret do Brasil, o travesti e dançarino que conseguiu a proeza de ser um dos vereadores mais bem votados de Salvador, pela coligação DEM/PR. Aos 24 anos, o jovem e humilde morador do Alto do Cruzeiro, bairro Pernambués, ganhou projeção apresentando-se com o grupo de pagode Saiddy Bamba, agora galgou definitivamente o patamar da fama ao receber 12.733 votos dos eleitores da capital baiana. Surpresa? “Não. Eu estava confiante. Quando a gente está em sintonia com o povo a gente sente. Mas, a ficha ainda não caiu”, diz, entre risos, a mais nova celebridade da política baiana, que garante ter chegado à Câmara Municipal “ para fazer a diferença”.
De personalidade descontraída, alegre e popular, Leo Kret soube capitalizar o carisma que externa por onde passa para vencer nas urnas. “Vou representar e defender a galera do gueto, dos bairros periféricos e os homossexuais”, as palavras parecem compor um discurso bem preparado, mas saem de maneira espontânea. “Não tive o apoio do GGB ( Grupo Gay da Bahia), queriam até me derrubar, mas vou lutar. A galera do GLBT pode contar comigo. Pretendo concretizar a lei contra a homo fobia. Minha campanha foi de poucos recursos, mas estou muito feliz. A humildade é o segredo do sucesso”, disse já falando como vereador. A que atribuir o sucesso? “À minha simpatia, luta e batalha, que me levaram à vitória. E às crianças, que não votam, mas pediram aos pais para votarem em mim”. Identidade civil: Alexsandro Souza dos Santos, natural de Salvador.
“A minha identidade social é feminina, a que se identifica com o povo... Leo Kret do Brasil!”, diz ensaiando o seu grito característico. A primeira infância foi vivida em Areia Branca, Lauro de Freitas. Há 16 anos os pais vieram morar na capital, com a prole de cinco. “Ele é tudo de bom. Chegou aqui pequeno, se criou no meio da gente, sempre dançando. Nunca teve confusão com ele. Faz o show dele e alegra todo mundo”, comenta a dona-de-casa Rosangela da Silva Santos, 48, orgulhosa por ter um vizinho famoso.
O pai, o comerciante Francisco Assis Gomes, 58, fechou o “Bar do Chico” já tarde da noite, depois da comemoração pela conquista da vereança. “Sou muito trabalhador”, afirmou depois de mandar descer guaraná para todos. A mãe, Eunice Souza dos Santos, 49, que parecia não caber dentro de si de tanta alegria, fala do rebento: “Ele é um bom menino. Agora vai ajudar os que precisam”. Quanto ao fato de ser travesti, o respeito e consideração dos pais “fizeram com que as pessoas passassem a me respeitar também”, responde Leo, que avisa estar com muita vontade de trabalhar pelos necessitados da cidade.



"Não vou ficar escondido na Câmara"



“Não vou ficar escondido dentro da Câmara por que aí serei como todos eles. Vou continuar dançando e ouvindo o povo, participando de reuniões. Não entendo muito de política, mas quero aprender muito, estudar, por que nunca é demais, e atualizar meus conhecimentos. E aqui vai o meu recado para os futuros colegas: Estou chegando no pedaço.
Quem puder ajudar que ajude, se não puder que não atrapalhe. O preconceito está caindo e vai cair muito mais”. Leo Kret nem sabe quanto vai ganhar como vereador, mas garante que sempre pagou as contas “com muito sacrifício e dançando”.
A mordomia que virá com a vida de político pretende usufruir e compartilhar com a equipe e com quem mais puder, mesmo porque a vida nunca foi fácil para o jovem dançarino, que de tanto aparecer nas apresentações do Saiddy Bamba acabou fazendo parte do grupo. “Vou tirar onda com muita gente que me humilhou”, garante. O coração, Leo garante que está livre por que “não tenho tempo para namorar”. Numa rápida passagem na Praça Municipal chamou a atenção de todos. Houve gritos e poses para fotos. Da Câmara de Vereadores conhece apenas a fachada. “Só vou entrar no dia 1º de janeiro e em grande estilo”. Como já pensa em ganhar gosto pela política, afirma que vai trabalhar para, quem sabe, no futuro partir para vôos maiores, ser deputado, etc.

Por Nelson Rocha/Tribuna da Bahia