domingo, 5 de julho de 2009

JORNALISMO BAIANO, AMEAÇAS E DIREITOS HUMANOS.


JORNALISMO BAIANO, AMEAÇAS E DIREITOS HUMANOS.

Vera Mattos*

Uma dos aspectos mais importantes para quem sofre
ameaças de morte é saber o quanto pode ou não vir a
ser apoiado pela família, amigos e sociedade.

Não importa as razões de ameaças que pesam sobre
qualquer pessoa. O que importa é como a sociedade
reage a isto.

E tenho visto de perto esta realidade. Existe o
direito inalienável de viver, de lutar pela vida. E
quando uma pessoa consciente, séria, serena,
profissional, abre a boca e diz  "estou sofrendo
ameaças" o que pode se esperar da imprensa? No mínimo
o desejo de realizar um bom jornalismo investigativo.

E não interessa quem é a provável vítima. Está diante
de pelo menos uma sugestão de pauta. Ou uma pauta
viva.

Ocorre que a banalização da morte é tão grande que
morrendo mais um não há qualquer problema. Vende-se
bem mais a cultura da morte do que a cultura da vida.

Infelizmente, tenho sentido isto na imprensa baiana.

Quando eu mesma informei da minha situação de mulher
ameaçada  eu tive duas sensações: ou a indiferença
tomou conta dos colegas jornalistas e radialistas ou a mídia colocou o caso  nos armários da mídia como arquivo morto.

Mas quando Kardé Mourão e Suzana Varjão tomaram a
iniciativa de colocar a questão em evidência pedindo
para que os colegas tomassem a iniciativa de ajudar,
aí vi sim que a imprensa baiana tem mesmo que
cuidar-se para  aprender a revalorizar a vida.

Não, não lamento por mim. Lamento por todos que
estando em situação de ameaça e que  não desperta na
imprensa local qualquer tipo de interesse. Nenhum
repórter, editor, nem mesmo de segurança se interessou
pelo caso. Nem mesmo aqueles que se encontram entre
os meus amigos e que ocupam funções importantes em
seus veículos.


Há mais de vinte anos atuando como jornalista, e em
grande parte fora de Salvador, fico impressionada do
fato de que seja necessário recorrer-se a lembranças
para agir.

Ou seja, não sabem quem é Vera Mattos. Não sabem de
onde apareceu esta mulher, para que agora tomem
partido por ela ou que pelo menos busquem saber do que
se trata. Será que sou vítima incluída na Maria da
Penha? Será um destes golpes que acontecem com todos
de telefonemas que saem dos presídios? Será que ela
quer aparecer?

Quando se tem uma carreira pautada na seriedade e se
alcança com esta carreira várias instâncias
proveitosas para uma categoria, não importa se aqui em
Salvador ou onde o vento faz a curva, no mínimo
merece-se consideração e atenção.

Porque qualquer um poderá vir a dizer a mesma frase no
futuro e ninguém poderá  vir a dar eco.

A razão é o desconhecimento dos direitos humanos. A
razão é a banalização da vida.

Faz-se urgente uma discussão séria sobre o tema para
profissionais de imprensa.

Não apenas saber dos direitos humanos e sim da sua
prática.

Como já disse minha história não é simples e vai para
uma projeção mais complexa já envolvendo delegados,
promotores e juízes. Mas não há razão para contar pois
não existe em Salvador qualquer jornalista
interessado. Nem veículo de comunicação interessado.

Quem falou em mágoas? Pensou em mágoas? Não tenho
nenhuma. Busco sempre algo positivo,  mesmo em
situações como esta,  em que sou a vítima permanente
de torturas psicológicas e ameaças reais que já
trazem prejuízos para os membros da minha família.

Tenho no jornalismo uma bela caminhada. Repórter e
editora de jornais como Tribuna da Bahia, Jornal da
Bahia, A Tarde e de emissoras de rádio e  tv o que me
faz também radialista. Enquanto em Salvador de Anísio
Félix a Raimundo Lima procurando fazer a minha parte
no Sindicato.

E estou ao dispor da Kardé Mourão a quem tive a honra
de convidar para o Ciclo de Mídia e Saúde Pública no
Brasil e a partir dali iniciar uma amizade.

Sempre fui daquelas que enfrentava tempestades para
conseguir uma boa reportagem. E foram páginas inteiras
publicadas, e matérias de televisão muito bem
sucedidas.

Aliás por ser tão bem sucedida em Salvador é que fui
convocada a exercer a profissão no Distrito Federal e
em outros Estados.

Então, mesmo tendo sido tão poucas as manifestações de
solidariedade,  me honra  o fato de Kardé Mourão como
mulher e presidente do Sinjorba haver realizado a
parte que lhe cabia; de Suzana Varjão do Estado de Paz
se manifestar de maneira tão preocupada e gentil.

Agradecer a Ana Alakja , Carlos Ribeiro e Sérgio
Mattos. A apreensão de Jolivaldo Freitas ao tomar
conhecimento após sua chegada.

Não se trata de ameaças a Vera Mattos mas sim a alguém
da mesma profissão.  Mais que isto: ameaça a vida.

E fica o meu apelo como Conselheira  em Direitos
Humanos: que se ofereça a categoria uma jornada,um
curso, para que haja uma sensibilização.

Do contrário teremos pela frente um jornalismo de
registros de chacinas e extermínios. A visão será do
"presunto" como algo comum. A notoriedade ficará por
conta dos fatos que ocorrem em outros locais, das
vitimas com as quais jamais nos envolvemos.

Aprendi muito na Bahia . Atuando desde o primeiro dia
do curso de Jornalismo  da Universidade Federal da
Bahia e, mesmo antes, quando já exercia o meu papel
político como secundarista em plena ditadura.

Continuo sofrendo ameaças. Poderão dizer: " se
tivessem que fazer,já teriam feito".

E eu digo: a tortura psicológica é grave. Manter a
pessoa sob tortura é crime grave.

Enquanto viva, sigo lutando pelas causas que abracei.
As frentes são muitas e exigem bastante, sempre
incomodando o poder estabelecido.


Certamente, se continuarmos agindo assim, assinaremos
petições on line  pedindo proteção para pessoas em
outros continentes mas não ouviremos o grito de
socorro de nossos vizinhos.



Mas eu continuo com sangue de repórter, coração de
repórter. Eterna aprendiz.


*Jornalista/Radialista


Jornalista Vera Mattos
Presidente da Fundação Maria Lúcia Jaqueira de Mattos
Dirigente da Seção Bahia - do Capítulo Brasil
do Fórum de Mulheres do Mercosul 

 http://jornalistaveramattos.blogspot.com 
 http://www.fundadacaojaqueira.org.br 
 http://www.veramattos.com.br



Jornalista Vera Mattos
Presidente da Fundação Maria Lúcia Jaqueira de Mattos
Dirigente da Seção Bahia - do Capítulo Brasil
do Fórum de Mulheres do Mercosul
Dirigente da Rede Risco Mulher Brasil
 
http://www.fundadacaojaqueira.org.br


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