quarta-feira, 22 de abril de 2009

Salvador:Guerra Sangrenta. Em três meses são 508 assassinatos


Nos três primeiros meses do ano de 2009 foram contabilizadas pelo Centro de Documentação e Estatística Policial (Cedep), 508 pessoas vítimas de crime doloso na Capital e Região Metropolitana. Os dados apontam um aumento em Salvador de 2,3 % em comparação ao mesmo período do ano passado.

Enquanto que na RMS, segundo o Cedep, houve uma redução de 13% se comparado aos meses do ano de 2008. Os números revelam que a cada dia, 6 a 7 pessoas são assassinadas na capital e RMS. Fica a pergunta: quem será a próxima vítima?

Estatística da polícia evidencia que 98% das pessoas mortas foram vítimas de arma de fogo, em seguida, às armas brancas (faca), e algumas mortes por espancamento. O aumento dos assassinatos começou a expandir no ano de 2007 que registrou a morte de 1.664 pessoas. Já no ano de 2008, marcado por 8 chacinas com 37 mortos, o Cedep computou 2.303 óbitos, tendo um aumento de 51,4% em comparação ao ano anterior. Vale salientar que vários autores das chacinas foram presos no mesmo ano. Tanto os especialistas quanto a polícia apontam o tráfico de drogas como a principal causa da matança.

Facilidade de possuir armas de fogo, drogas, falta de emprego, desigualdade social, falta de atuação do Estado, são alguns dos motivos apontados pelos estudiosos para justificar o aumento dos assassinatos. O maior número de mortos se encontra nos bairros periféricos e invasões da capital. Segundo pesquisas do Fórum Comunitário de Combate a Violência (FCCV), a maioria das vítimas dos assassinatos, são jovens, pobres, negros, com idade entre 14 e 25 anos.

A gestora do FCCV, Tânia Cordeiro, acredita que a violência é um aspecto social que reflete na saúde e qualidade de vida das pessoas. E ainda ressalta que os assassinatos são consequências também da desigualdade social dos indivíduos que não têm outra alternativa, acabam entrando no mundo das drogas. Tânia acredita que é preciso que os governantes invistam na melhor qualidade de vida das pessoas, moradoras de bairros periféricos que estão abandonados e se encontram à margem da sociedade.

No entanto, o secretário de Segurança Pública, César Nunes, disse que esse ano, em decorrência de ações preventivas de policiais desenvolvidas na Bahia, houve uma redução nos números de assassinatos.

"Estamos com menos 8% de homicídios no período de janeiro a março de 2009, em relação ao mesmo período de 2008, na Bahia. As polícias passaram a ser proativas e não mais reativa como no passado, ou seja, estamos partindo para cima dos bandidos e investigando as quadrilhas e seus matadores. Sendo que muitos deles, foram presos ou morreram em confronto com a polícia", pontuou o secretário.

Os caminhos percorridos no tráfico de drogas levam a um percurso perigoso e sem volta. Quando o destino não é a morte, resta a prisão, e mesmo ao sair da cadeia, o traficante torna-se alvo dos rivais, devido às disputas pelo território do tráfico. No final da manhã da última quarta-feira, o acusado pela polícia de ser o maior traficante da área do bairro de Boca do Rio, Maurício Conceição da Anunciação, mais conhecido como "Mau-Mau", foi morto após troca de tiros com policiais da Rondesp, Rotamo e 39ª CIPM (Boca do Rio) no bairro de Castelo Branco. Com ele, os policiais apreenderam uma pistola 9 mm, com três carregadores, além de certa quantidade de maconha. A mulher do traficante, identificada apenas como "Fernanda", também foi detida. De acordo com os policiais, "Mau-Mau" era um dos traficantes mais procurados da Boca do Rio. Ele era acusado de comandar o tráfico no bairro, além de praticar vários assaltos e mais de dez execuções. A polícia acredita que ele se refugiou no bairro de Águas Claras, pelo fato de estar sendo procurado na Boca no Rio.

O delegado Deraldo Damasceno, que tem 32 anos de atuação na polícia e trabalha na 5ª delegacia, situada no bairro de Periperi, que atende o Subúrbio Ferroviário, acredita que o aumento dos assassinatos seja decorrência do aumento populacional e a exclusão social. "A maioria das vítimas e os criminosos são jovens entre 18 e 25 anos que se adentram para a criminalidade. A falta de emprego, educação e políticas públicas, os jovens traficando e roubando em busca de dinheiro. Devido a isso, acontecem essas mortes entre eles mesmos".

O tentador e fatal caminho do tráfico

A maioria dos jovens presos por tráfico de drogas alega a falta de emprego e oportunidade para ingressar no mercado de trabalho. Eles acabam buscando como saída trabalhar para traficantes em busca de dinheiro, prática que pode acabar em morte. Nos bairros periféricos, muitas crianças são usadas pelos traficantes para fazer os trabalhos como "aviões", que é quem entrega a droga aos compradores. Essas crianças vão crescendo e o caminho que encontra para ganhar dinheiro é comercializar drogas.

E a partir daí, este jovem passa a ser alvo dos concorrentes que disputam a melhor venda de drogas no bairro, e até chega a montar sua própria "boca de fumo". Várias ruas são utilizadas como pontos de venda de drogas e cada traficante adquire por meio ilegal, uma arma para proteção contra o rival. E devido às disputas, muitos jovens entram para o rol da numerosa estatística de assassinatos. O pior de tudo é que eles são conscientes do que possa acontecer. Tornar-se um assassino, ir preso, ser morto pelo rival ou pela polícia. Esses são os principais desafios que vivem os jovens que entram para o mundo do tráfico.

Um rapaz que foi preso por estar traficando em sua própria residência, sem se identificar, disse que trabalhava fazendo bicos de pedreiro, mas o dinheiro pouco não dava para sustentar sua filha e esposa. "Um conhecido me passou umas "ervas" e pedras de crack para eu vender. Com as vendas, acabei ganhando um dinheirinho bom, e parti para o tráfico. Passei a comprar cocaína que dá mais dinheiro, comprei uma arma para me defender, mas agora acabei preso. Esse é o preço que pagamos, infelizmente", disse o jovem ressaltando que nunca havia sido preso e nunca matou ninguém. "Mas se houvesse necessidade, para me defender e a minha família, usaria a arma. Sei do risco que corro, mas foi o único jeito que encontrei para ganhar dinheiro", disse um homem de 22 anos, que foi preso em Lauro de Freitas. Ele tinha uma "boca de fumo" montada em sua residência na área da Lagoa dos Patos, no mesmo bairro.

Polícia destaca falta de oportunidades

O delegado Deraldo Damasceno vem trabalhando com sua equipe no combate ao tráfico de drogas no Subúrbio Ferroviário que atende mais de 600 mil moradores, acredita que o crescimento populacional e a exclusão social, sejam o principal agravante para os números exorbitantes de pessoas executadas.

Deraldo ressaltou que várias prisões foram realizadas esse ano no Subúrbio, tendo como acusados, jovens iniciantes no mundo do crime. "A maioria das pessoas aqui presas, são jovens de 18 a 25 anos. Nós, juntamente com a Polícia Militar, estamos atuando fortemente no combate ao tráfico de drogas. Mas, para que esses números se reduzem, é preciso investimento em políticas públicas para que essas pessoas sejam inclusos na sociedade", disse o delegado, salientando que os rapazes que entram para o mundo do tráfico, têm os mesmos desejos que um jovem de classe média. "Eles almejam roupas de marcas, celulares da moda, carro para dirigir, como não tem, acabam entrando para o tráfico, como saída para ganhar dinheiro e saciar esses desejos. Depois, passa de empregado ao líder do tráfico e é a partir daí, que começa a guerra sangrenta. Muitos morrem antes dos 25 anos. Infelizmente, o tráfico é uma porta sem saída, ou morre ou será preso", completou o delegado.

César Nunes acrescentou que Segurança Pública não é só polícia, "mas, também é preciso desenvolver ações voltadas à educação, emprego e dignidade. Ações que busque reviver valores, como a família e o respeito aos cidadãos", reforçou Nunes.




Publicada: 22/04/2009
Silvana Blesa
(Tribuna da Bahia)

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